quarta-feira, 30 de setembro de 2015

UMA CAMPINA

30 de setembro de 2015
Resta então verificar se os conteúdos propostos aos alunos verdadeiramente os ajudam a explicar a realidade e a levantar problemas dentro dela, ou se, pelo contrário, contribuem para torná-los mais alienados.
[...]
Ou seja: “cultura” não é só a arte, nem só as ciências, como se costuma entender graças ao uso corrente desse termo; a cultura abarca a totalidade da conduta adquirida pelo homem; sua linguagem, seus valores, seus costumes, os alimentos que prepara e a maneira de viver e de ver a vida, etc..
Assim, não existem homens cultos ou incultos, nem homens com “muita” ou “pouca” cultura, como normalmente se diz. Existem, simplesmente, homens com culturas diferentes.
[...]
Numa sociedade de classes como a nossa, a classe dominante difunde e impõe seus critérios culturais que passam a ser, por esse motivo, o correto.
[...]
A sociedade valoriza especialmente o triunfador; consequentemente a escola vai incentivando essa formação de pequenos triunfadores e competidores.
[...]
Os pais e professores valorizam de diversas maneiras as notas boas, acima de outros valores que as crianças possam ter.
[...]
E somos nós mesmos quem incentivamos essa atitude competitiva na medida em que valorizamos a obra produzida pela equipe, sem levar em conta o processo através do qual a equipe elaborou.
[...]
- a super-valorização dos “heróis” e das ações individuais, como decisivas na História.
[...]
Assim, um aluno poderá tirar nota 10 na lição sobre a “fraternidade” e ser um individualista de primeira categoria. Um outro aluno, no entanto, pode tirar nota baixa “por não saber a lição”, ainda que seu comportamento com os companheiros seja verdadeiramente fraternal. Em suma, encontramo-nos no reino da hipocrisia.
UMA ESCOLA PARA O POVO (MAESTRO PUEBLO O MAESTRO GENDARME?) María Teresa Nidelcoff, 17ª edição editora brasiliense 1978, copyright by  Editorial Biblioteca/Departamento de Publicaciones C. C. Vigil/Rosário/Argentina 1975 .
Quando a corrupção é estrutural, não conjuntural como alguns golpistas querem fazer crer e o individualismo faz, principalmente do Sudeste Brasileiro ainda se pensar como se o Brasil estivesse em plena Escravidão, acordei pensando na Campina, como era chamada a integração dos estudantes, no início de novo período, na Agronomia.
Depois de um período onde se incentivava a riqueza pela riqueza de qualquer maneira, como já falei em CRISE SIM, DE ARRIVISMO que levava ao extremo individualismo que deformava e ainda deforma o caráter de muita gente, a “corrida do ouro” nos tempos atuais, não se poderia esperar gente melhor formada, senão cada vez mais, ensimesmada e sempre analisando o mundo, a partir de seus interesses individuais.
[...]
Globalizamos a cultura e a economia, mas não globalizamos a cidadania, o humanismo e a democracia das ideias, não globalizamos o sentido psicossocial de espécie.
[...]
Creio que a mais grave doença da nossa espécie não é a AIDS, o câncer, a depressão, mas a perda generalizada do sentido psicossocial de espécie, que se torna uma grande fonte de violação dos direitos humanos.
[...]
Para aqueles que conhecem a cidadania apenas no discurso, a miséria humana é uma grande mercadoria para ser usada para promoção social. O exercício mais nobre da cidadania, é aquele que faz no silêncio, que se faz sem alardes, que se faz sem esperar a contrapartida do retorno. O único retorno legítimo que deveria ser almejado da cidadania é aquele produzido pelo prazer de contemplar a melhora da qualidade de vida do outro, da sociedade e do meio ambiente.
[...]
A síndrome da exteriorização existencial é uma doença psicossocial epidêmica nas sociedades modernas. Ela se expressa pela dificuldade crônica de interiorização, ou seja, de aprender a se questionar, a se repensar, de assumir as fragilidades, de trabalhar seus estímulos estressantes e suas reações emocionais; de usar os erros e as frustrações como alicerces para desenvolver a maturidade da inteligência; de se colocar como aprendiz no processo existencial; de aprender a se colocar no lugar do outro e a exercer a cidadania e o humanismo nas relações sociais.
[...]
O portador da síndrome da exteriorização existencial vive, como já comentei, a maior de todas as solidões, que a é a solidão de abandonar a si mesmo em sua trajetória existencial.
As doenças psicossociais, tais como a discriminação racial, intelectual e outras; a supervalorização doentia de uma grande maioria por uma pequena minoria de personagens sociais; a farmacodependência, a agressividade, o individualismo social; a indiferença psicossocial em relação às dores e necessidades do “outro”, etc., são cultivadas pela maior de todas as doenças psicossociais, que é a síndrome da exteriorização existencial.
[...]
O processo educacional ortodoxo é exteriorizante, pois leva os jovens a conhecer muito o mundo em que estão, mas pouquíssimo o mundo que eles são. É “a-histórico-crítico-existencial” porque pouco expande a inteligência, a democracia das ideias e o gerenciamento dos pensamentos e das emoções.
[...]
Esse tipo de educação gera facilmente o “mal do logos estéril”.
O mal do logos estéril é uma doença intelectual e até psicossocial causada pelo próprio processo educacional. Os alunos que são acometidos por ele se tornam espectadores passivos diante da transmissão do conhecimento, incorporando-o sem crítica, sem dúvida, sem sabor, sem deleite, sem desafios, sem “rosto”, sem utilidade humanística, sem compromissos psicossoais, sem história. Há vários níveis dessa doença, e quanto mais grave ela for, mais as pessoas acometidas por ela se tornam manipuláveis, influenciáveis, meras retransmissoras do conhecimento, como se fosse verdade absoluta, inquestionável; por isso, ao mesmo tempo que são manipuláveis, elas se tornam autoritárias. Os dramáticos erros cometidos na história pelo uso radical de ideologias políticas, econômicas, misticistas, raciais, foram produzidos por portadores dessa doença.
[...]
Porém, há uma distância enorme entre ser um profissional, que usa o conhecimento apenas como ferramenta profissionalizante para benefício próprio, e ser um pensador humanista que aprecia a cidadania, a democracia das ideias e que tem compromissos psicossociais e sociopolíticos.
[...]
... sem a consciência existencial não existimos para nós mesmos, somos seres errantes, meros objetos vagando no tempo e no espaço.
[...]
O homem que deseja que o mundo gravite somente em torno de suas necessidades não é bom para a sua espécie, não compreendeu minimamente o espetáculo da construção de pensamentos.
INTELIGÊNCIA MULTIFOCAL, Doutor Augusto Jorge Cury, editora Pensamento Cultrix LTDA , 1998
[...]
Já disse, o mundo virou um grande elevador, daqueles em que alguém peidou e se entra e o futum ainda persiste, para ninguém pensar que foi algum de nós, fica todo mundo de cabeça baixa. Ninguém conversa, ou ao menos, troca um olhar, ou um sorriso. É um lugar cada vez mais sagrado e como tal, individualista, cada um com seu smartphone, seu tablet, solitariamente, em um mundo cada vez mais superpovoado.
O ápice do Pensamento Liberal, de quanto puder se afastar do outro, melhor, o quanto mais se puder “vencer” sobre todos, sem se preocupar com as consequências, melhor. A busca pelo individualismo pessoal e o monopólio de mercado.
Os namorados estão frente a frente, comunicando-se com seus aparelhos. Com outros namorados e namoradas virtuais que dão mais prazer. Depois não se sabe, porque meninos ainda, no fulgor do tesão, da sexualidade nos poros, precisam cada vez mais de Viagra para ficarem de pau duro, com um mulherão, ou até um rapagão nuzinhos em suas frentes e quem sabe, até por trás. Será preciso explicar?
Sexo é uma coisa em que o individualismo atrapalha. O cara tem 20 anos é preciso fazer “terra” para pegar no tranco. É que cada dia que passa, desaprende-se a conviver com o ser humano, tudo tem de ser feito via internet, inclusive dar uma pimbadinha. Vai ser cada vez mais difícil, não gaguejar, quando se enfrentar um público de verdade, porque na internet se pode to delete, pode-se consertar, apelar para subterfúgios que pareçam excepcionais, no real, a coisa pega. A vida não tem volta, o que saiu, não tem como retornar. Nem a palavra, nem um filho, nem um cagalhão que seja. Saiu, não tem como pegar de novo, retocar e colocar mais “vendável”, ou apresentável.
(...)
No Sudeste Brasileiro, não o “fuleiro inculto” ou o “Paraíba” preguiçoso que se vale do Bolsa-Família, nem o “Ceará”, peão de obra, muito menos o delinquente juvenil da periferia fronteiriça da pré-História sem estado, nem um desses, mas os doutores de títulos e de imposição, as classes mais abastadas, os letrados e mais cultos, os estudados, os viajados, os poderosos, os ricos, estão voltando a pensar como no Brasil Colônia, ou no Brasil Coroa, quando se valia do trabalho escravo, para se dar bem, quando se segregava milhões, na base do chicote.
A elite paulista, representada por gente como o Skaf e o João Dória Junior – que Deus os perdoe -, segregando o Brasil, como um todo, por seus interesses vencidos. Para essa gente tosca, mas muito bem vestida, o Brasil é só até o quintal de casa. Nordeste, Norte, Centro-Oeste, algumas vezes, o Sul e até o Espírito Santo, são outro país, que só atrapalham o “progresso” de suas classes.
O Rio de Janeiro que tem um verniz de sempre aberto ao novo, mas só o verniz, só a máscara – Estado que mais se valeu da escravidão e por isso, ficou o racismo e o preconceito velados – onde se param ônibus que venham da Zona Norte, ou das “comunidades” que eu continuo a chamar de favelas para tirar crianças e adolescentes, por serem pobres, - não terem o dinheiro da passagem de volta -, por usarem “chinelinhas”, por estarem sem camisa, por terem as vestes amarfanhadas. Como se fazia na Ditadura, no Nazismo, sem que o cidadão esteja cometendo nenhum crime, por ser pobre, ou não pertencer à elite, por si, já é criminoso. No Rio de Janeiro. Não é no tempo de Zumbi, é hoje, 2015, Século XXI que os crédulos afirmavam que era a Era de Aquário. Não é no Nordeste, tão discriminado, nas Alagoas, com os quilombos, principalmente de Zumbi, de Gangazumba, dos Palmares, não, no Sudeste do Brasil.
Duvido se os meninos Zona Sul sem dinheiro da passagem, estiverem com “sandalhinhas”, se o mesmo contingente dirigido por um gaúcho que como sempre, elitista, racista, metido a estrangeiro dentro do país onde nasceu, prendê-los-ias. O Rio, além de se valer da Escravidão imoral, mais sangrenta e demorada, com o maior contingente de escravos, por ter sido a Capital Federal, é hoje considerada a Capital Cultural do Brasil – imagina o Brasil que não tem cultura. Se o Rio representa a cultura nacional -, vê a chegada de muita gente do mundo inteiro. E esse pessoal, como o Secretário de Segurança Pública, trás consigo, toda a falta de valores, como é típico à elite gaúcha, sempre se achando quase extraterrestre e sempre acima de todo mundo. Misturado àquela gente “do asfalto” que só considera o “Ri”, Copacabana, Ipanema, Leblon, Botafogo, Flamengo, Glória e agora, os “emergentes”, Zona Oeste, representada pela Barra da Tijuca, nem lá, nem cá, em se tratando das favelas, mesmo as da Zona Sul, ou Oeste, Quintino, São Cristovão, Deodoro, Zona Norte, já é outro país. A Tijuca é a fronteira bem no meio. Imagina Xerém, Campos – mesmo sendo o município, depois do Rio mais rico, que mais recebe royalties da PETROBRÁS e mesmo assim, é extremamente miserável -, a Baixada Fluminense. É outro mundo, não faz parte do “Ri” racista e cada vez mais fascista, com uma gente que cada dia que passa, acha que é o Senhor da Casa Grande e por isso, tem permissão para foder com o povo da Senzala.
Em suma, quando todos esses fatores se combinam, não é de se esperar que os trotes em calouros, sejam menos agressivos, mais participativos e tenham um caráter de integrar, ao invés de machucar os outros.
Que cidadãos estamos legando ao mundo? Sim, eu não tenho filho, mas a educação das gerações tem de ser compartilhada entre pais, professores e sociedade como um todo, porque aquele menino chato da mamãe, aquela menina mimada do papai, não vão viver todo o tempo em casa, vão interagir e integrar uma sociedade mais ampla e vão ser problemáticos se não integrados devidamente. Era justamente o que pregavam Marx, Engels, Lenin, que os valores do coletivo fossem mais significantes do que os valores individuais de cada família que acabavam prejudicando o convívio coletivo. Papai e mamãe, como todos, morrem, e a sociedade, o coletivo persistem, até quem sabe, o Dia do Juízo Final, ou do colapso do sistema solar, galático – não no sentido de gala, de gozar nos peitos alheios - etc..
(...)
Dia desses, peguei um táxi, onde o taxista dizia que a filha dele, de poucos anos, acho que dois anos, vive ligada no smartphone. Falei que existem estudos que garantem que, principalmente para as crianças, a energia de micro-ondas produzida pelo celular, afetam sim, o desenvolvimento do crânio. Os ossos ainda estão em maturação, expostas aos celulares, acabam ficando uma bosta. Atrofiam e acabam interferindo no cérebro como um todo. Mas ninguém divulga, lógico, é a tal lei de mercado.
- Estão gerando uma nova Geração da Talidomida. Foi do teu tempo, crianças que nasceram problemáticas, aleijadas, porque diziam que o remédio fabricado na Alemanha, não fazia mal algum? E tomaram... Depois que fizeram muito mal, é que divulgaram que a Talidomida não pode ser consumida por mulheres grávidas, pois antes, quando queriam vender, diziam que servia para evitar enjoos da gravidez. Sabe quem produz energia micro-ondas? As estrelas. Sabe a estrela mais próxima de nós? O Sol. Sabe a distância média do Sol à Terra? 150 milhões de quilômetros. É coisa pra caralho. Mesmo com muita interferência de toda ordem, no caminho, a energia gerada no Sol, quando chega por aqui, afeta muita coisa, inclusive a saúde. Agora imagina uma pessoa exposta à merda de uma energia de micro-ondas produzida diretamente de um aparelho no peito, na bunda, na orelha, no fêmur... E tem filho da puta que até para esquentar a água pro chá, usa o forno de micro-ondas. Imagina o futuro próximo.
- Mas como eu tiro o smartphone dela? Ela adora...
Em todas as espécies animais, os mais velhos é que ensinam as crias, na espécie humana está tudo desvirtuado. O filho é que diz como deve ser sua criação, o estudante é que manda o professor fazer o que quer, ou seja, estamos legando aos menos “sabidos”, a responsabilidade que nos cabe. No dia que tiverem de caçar, diante de uma onça, com esse espírito arrogante e petulante, vão se foder, pensando que podem tudo.
- Quem deu um celular à uma criança? Então assim como acostumou, desacostuma.
Alguns dias depois, peguei o mesmo táxi.
- E aí, como vai o teu filho?
- Filha!
- Já deixou o smartphone?
Pelo riso, não. É melhor ela parecer aos outros, filha de quem pode dar um celular à uma criança, do que crescer saudável. Depois não sabem por que tanta gente morrendo de tanto câncer. É preciso explicação?
As abelhas estão sumindo, porque empresas inventaram a semente transgênica, que gera altos lucros, mas interfere no ciclo natural das coisas. O leite tem de ser sem lactose, o café, descafeinado, o trigo sem glúten, tudo faz mal. Por quê? Porque a banana-pacovã que era enorme, naturalmente, a EMBRAPA achou que daquele jeito, acumulava muitas pestes. Então misturou o código genético da pacovã, com a nanica e a maçã, ficou uma merda, pequenininha e que vai do verde, ao lixo, por não se saber o tempo exato de consumo. O trigo, o leite, o ovo, tudo foi modificado. O natural é coisa de gente atrasada. Bonito mesmo, é “dominar” a natureza. E se produz AIDS, Ebola, tantos vírus em laboratório, para depois se espalhar no ambiente, para se enriquecer, produzindo remédios para combater o que eles mesmos criaram. É o Capitalismo, o lucro de qualquer maneira.
As pessoas, como diz o INTELIGÊNCIA MULTIFOCAL, exteriorizadas, vivem de aparência. Houve o tempo em que mostrar poder, era dar um automóvel, ao filho de 15 anos. Outro tempo, em que poder, era o filho ostentar um pen-drive – como diz o Noval, um pênis-drive – no pescoço. E agora, parece questão de honra, para se colocar acima da ralé, dar um smartphone aos filhos, mesmo que depois, sejam completos idiotas. Crianças sem saber andar, falar e engatinhar, com páginas sociais. Extrema futilidade.  
Um tempo desses, numa sala de espera para ser atendido para fazer exames médicos, um som alto e chato. Depois percebi que o carrinho de bebê estava estranhamente iluminado. Por fim, revelou-se. Um bebê, com um tablet, brincando, inclusive nos pés.
- Ah, é como ele fica calminho!
A mãe se vangloriava do filho ser embalado por um aparelho eletrônico, quando ela deveria estreitar os laços com aquele merda que cagou no mundo, aproveitar, para legar uma pessoa bem resolvida ao mundo, ao invés daquele traste que visivelmente atrapalhava os planos dos pais de serem eternos solteiros individualistas, mesmo depois de jurarem amor eterno e uma família perfeita.
Dá um tempo. Gente atrasada, pensando que por utilizar isso, ou aquilo, vai sair da Idade da Pedra por osmose.
OS TROTES
Devo dizer que não tive trote na Física, por estar servindo o “Glorioso” Exército Brasileiro. Quando o Coronel me liberou para estudar, já havia passado o tempo de trotes. E fiquei por pouco tempo, até o Major dizer que não podia ter regalias. Na Economia, nem parecia que havíamos entrado. O pessoal estava muito preocupado com “este comunista” que era eu. Só depois que pegamos o Centro Acadêmico, é que íamos levar nossos préstimos aos novos colegas. E em Administração, fui aprovado no vestibular e reprovado na última matéria de Economia, tinha-se de escolher, não se podia estudar duas áreas ao mesmo tempo, tive de fazer novo vestibular no ano seguinte, onde entrei na turma da Acácia, mas nem soube que turma era aquela, por pedir reaproveitamento de todas as matérias possíveis e imagináveis, como Cálculo, Álgebra. Ecologia, Matemática etc. e só me terem dado o aval para estudar, pelo menos um período posterior, com uma matéria optativa.
Mas na Exatas/Tecnologia, o trote na verdade, era uma forma de brincar com a cara dos novatos, como uma vez, que eu já falei, combinamos entrar em sala de aula, muitos, como estudantes reprovados e um como professor. O Urubu.
Eram umas matérias tão malucas que misturavam integral com derivada, com conjunto, só quem sabia, eram os reprovados.
- Meu filho, você estudou onde?
- Na Escola Técnica fessor.
- No Colégio Militar.
- Mas eu estudei lá e nunca vi isso.
No fim.
- Por favor tirem uma página do caderno, deixem apenas lápis, borracha e caneta encima da mesa. Prova.
- Mas professor, prova no primeiro dia?
- Não discutam.
Lógico, ninguém acertou nada. Só os alunos reprovados. Dez!
No fim, quando nos apresentamos, muitos já estavam chorando e um deles, o mais malandro, deu um discurso enternecedor que falava que pensava que a universidade fosse um lugar de mais integração entre as pessoas, onde todos estivessem ali, pensando em grupo, mas ninguém quis passar a “cola” para ele. Bando de individualista. O pior veio depois, quando o Moacir, professor doutor mestre, de verdade, entrou na sala e ninguém entrou. Ele foi chamar a turma e ainda levou na cara.
- Tás pensando que somos otários? Já nos pegaram. Tu, professor? Vai procurar outra turma leso!
- Mas eu sou o professor de vocês desta turma. Vou fazer a chamada, quem não entrar, já vai levar falta.
Outras vezes, a recepção aos calouros do Campus, hoje conhecido como Mini-Campus, era plantarem uma semente no saco de plantar e depois, plantar no bosque que circundavam as salas.
Outro trote, quando a chapa Clarear da qual eu era Diretor, foi uma festa, com um almoço, no Bandejão do Campus. 1983, quando entraram a Acácia, a Maravilhosa que estava com uma minissaia, umas coxas, não sei por que, fiquei atraído de cara. Nós já nos conhecíamos, quando o C.A. de Economia, Jefferson Praia, Zé Ricardo Wendling, eu e talvez mais alguém se deslocou até o Campus, onde ficavam os calouros de Economia, para nos apresentarmos.
Eu e o Caubí  Cerquinha, irmão de uma amiga que era “gostosa”, completamente diferente dele, ficamos na recepção do pessoal. Ele com a câmera, eu entrevistando. Depois, cansou eu fiquei com a câmara, dei uns zoons na Maravilhosa, fiz uns efeitos que estava mais para defeitos fotográficos e por fim, o Caubí jura que queimei o filme. Graças a Deus, pois teve gente queimando, tanta coisa, desde aquele dia, de mato à rosca e eu só queimei o filme da câmara.
Não havia humilhação, ou tentativa de se rebaixar os outros. Sempre eram atividades para congregar, para congraçar.
Mas agora, as ações são individuais e cada vez mais, discricionárias em relação a todo mundo. Não é que aconteça isso no seio das universidades, é que refletem essa ideologia de se dar bem de qualquer maneira, que se fodam os outros. Eu sou o centro do mundo. Eu sou o rei. O estado sou eu. E o resto é só o resto e só. Cada um por si e Deus contra todos, como diz uma letra dos Titãs.
Já não chegam as famílias com um só filho, imagina o mundo futuro. Ainda com um conceito de personalizar tudo, como diz o Slavoj no PRIMEIRO COMO TRAGÉDIA, DEPOIS COMO FARSA.
[...]
Nas livrarias há uma superabundância de manuais de psicologia que nos ensinam como ter sucesso, como superar sócios e concorrentes, em resumo, tratam o sucesso como se este dependesse de uma “atitude” apropriada.
[...]
Pois se democracia significa representação, é antes de tudo a representação do sistema geral que gera suas formas. Em outras palavras, a democracia eleitoral só é representativa na medida em que é antes de tudo, a representação consensual do capitalismo ou do que hoje foi rebatizado de “economia de mercado”. Essa é sua corrupção subjacente[...]41
41. Alain Badiou, The Meaning of Sarkozy, cit., p. 91
[…]
“Num artigo para a revista Newsweek, Emily Flynn Vencat e Ginanne Brownell relatam como hoje em dia”
O fenômeno do “só para sócios” está explodindo num novo estilo de vida que abrange tudo, desde relações bancárias privativas até clínicas que só aceitam pacientes convidados[...] cada vez mais aqueles que têm dinheiro trancam sua vida a sete chaves. Em vez de comparecer a eventos com grande cobertura midiática, contratam espetáculos, desfiles de moda e exposições particulares de arte em casa. Compram fora do horário comercial e mandam investigar a classe social e o patrimônio de vizinhos (e possíveis amigos).
[...]
Por isso, grupos de pagode que dizem que são samba, MPB e que surgiram por causa do Governo Collour, neoliberal e subserviente aos interesses do capital internacional, para divulgarem um Brasil elitista, que aquela elite das usinas de cana queriam que fosse, com o Sertanejo, o que a Bossa-Nova foi para o Governo JK, disseminaram o sentido do “só pra diretoria”. Uma gente fuleira e sem nada a acrescentar que quer se destacar, ou segregar os outros, em redomas sociais, por puro medo de mostrarem seu vazio completo.
A CAMPINA
Talvez, por ser dividida a Universidade Federal do Amazonas no meu tempo de estudante, em ICHL, PT, Direito, PCB, Agronomia, PCdoB, o congraçamento com os calouros, fosse diferente de hoje e de outros tempos e de outras Unidades.
Era feita a Campina das quais, participei de algumas. Diferente até na forma de adquirir mantimentos e outras necessidades.
Um grupo era formado para ir aos lojistas, pedir dinheiro para o combustível dos ônibus cedidos pela UA, atual UFAm, e gêneros de primeira necessidade. O sentido de grupo, era mais forte do que a vaquinha para conseguir tudo de uma só vez.
Nesse tempo, eu fui colocado no grupo que iria ao Centro de Manaus.
Como na Economia, quando um colega ficou puto, ao pedir ajuda de custo ao Deputado Átila Lins que havia sido nosso colega, para os Jogos Universitários. Ele, já político, pensaram que fosse ajudar de uma só vez.
- Porra, o Átila deu... (o equivalente a R$ 10,00 hoje) Miserável, parece que não conhece a gente. Vai ajudar em quê nos equipamentos de Basket?
Era assim também, na hora de pedir. Com os grandes conglomerados, ou com lojinhas bem pequenas, era sempre diametralmente diferente ao tamanho. Em supermercado, não davam muita coisa. Naquele tempo havia dois, ou três supermercados de destaque. Casas da Banha, Casas do Óleo, Americanas, ou do Grupo Braga que depois virou Americanas na Eduardo Ribeiro se não me esqueço. Já nas lojinhas na beira do Mercado, como se diz, davam de sacas de feijão, arroz, açúcar, farinha etc..
Ou seja, como sempre se diz, o pobre, mesmo em dificuldade, sempre divide com os outros, já os mais abastados... Só falando em Deus.
Nesse dia em que fomos mendigar, choveu. Uma sexta-feira. Fomos recolhendo mantimentos desde o raiar do dia, até o início da noite. O roçar das minhas coxas esculpidas com muito peso no Fisiculturismo, num pano das calças, molhado, acarretou em duas grandes bolhas de sangue nas duas coxas, quase nas virilhas.
Não tinha como chorar pelo leite derramado, o jeito foi vestir uma sunga e puxar para cima, para não atritar com as bolhas que estavam bastante doloridas. Fiquei de sunga, do ônibus, até quando finalmente estourou por si.
Sábado de manhã, na Praça São Sebastião, reunião de todo mundo. Bem cedo para a Campina, uma base do INPA, emprestada aos estudantes. Eu já fui no maior ônibus, do motorista com quem mais tinha intimidade que hoje, como todos os outros daquele tempo, estão aposentados. Eu sempre falo com eles e com os garçons da Reitoria que o abestalhado Professor Nina, meteu uma ordem que só podia participar do Conselho Universitário, quem estivesse de paletó. Então, o jeito era emprestar os paletós dos garçons, muitas vezes, apertado no corpo, meter a gravata encima da camisa de algodão, só quem não usava paletó, era o Professor Nina que usava jaquetão, sei lá como é o nome. Os garçons tinham de servir, só de camisa de manga comprida.
Dentro do ônibus, já de ida para a Campina, de repente alguém falou que iria ter suruba. A namorada do Silas que depois foi do Partido, eram calouros e ela, recém-chegada do Ceará, dizia que gostava muito.
- Gostas de suruba também?
- Muito!
- Maravilha! Quem mais se habilita?
E o Silas puxando a garota que não parava de salivar, por causa da suruba. Até que finalmente ela se tocou, ele a avisou que suruba no Amazonas, tem outro sentido, e ela revelou que a suruba que ela estava pensando, era um peixe muito consumido no Ceará. Aqui também, mas de outra forma. Uma suruba de vez em quando, faz muito bem. Como dizia Seu Clóvis, tem quem dê o rabo para chupar a cabeça!
Eu, já macaco velho, sabia que existia uma divisão entre homens e mulheres, só no discurso. As mulheres dormiam nos quartos, onde o gerador colocava a energia a toda hora e os homens, num alojamento escuro, sem a menor iluminação, onde se tinha de subir um morro enorme, as portas abertas todo o tempo, no meio da floresta, distante de qualquer civilização, até para fazer as necessidades, era preciso entrar mais na floresta para fazer as necessidades, enquanto no alojamento feminino, era tudo na mão. Já falei à Acácia que iria dormir com ela. Ela estava em um beliche, na parte de cima. Havia sempre uma terceira via, para quem nem queria o lado feminino, nem o masculino, a barraca, dos Dragões, de onde saía muita fumaça e de vez em quando, um pessoal com os olhos vermelhos, quase sangrando. Mas era longe e em frente do alojamento feminino. Fechado só para “sócios”.
Então chegamos, começaram os trabalhos. Volley, Futebol, mas o que eu participava, era a descida do igarapé. Até um certo ponto, a água era caudalosa, forte, mas todos, inclusive o Menudo que é meia-gala de pessoa, conseguiam ficar de pé. Quando o igarapé começava a ficar rodeado de floresta, e receber outros que faziam-no imenso, era quando ou se ia de boia, feita de câmera de pneu, ou a nado. Era muito fundo, uma correnteza muito forte, a água ficava muito fria e não tinha para onde nadar, por falta de orla. Uma das calouras, feia pacas, mas que eu fiquei com o maior tesão do mundo, daquelas que parece que nasceram com mais dentes do que cabem na boca, resolveu se afogar, justamente onde estava mais fundo e com a maior correnteza. Eu fui ajudá-la, ao invés de ficar calma, piorou a situação, eu já estava perdendo as forças e não chegava ao menos uma praia que havia no meio do percurso.  Foram momentos extenuantes e de intenso perigo. O jeito foi sair empurrando-a, de baixo para cima, até conseguir dar pé. Empurrando, no sentido de jogá-la para frente, não de empurrar nela. 
Havia uma boia imensa, para esse pessoal. Ao lado, garrafões de Sangue de Boi que dentro d’ água, nem afundavam e ao mesmo tempo, gelavam, só em contato com a água.
Uma, duas, três, várias descidas no igarapé, além de bronzeado, ainda estava cansado. De repente, quando chegamos ao fim de uma das aventuras, um calouro de Biomédicas, do Sul Maravilha, correu para o mato, subiu o morro e desapareceu por um bom tempo. Foi logo apelidado de Cagão Boy, com relação a uma música que fazia sucesso, chamada Tarzan Boy.
Ooooooooooo
Ooooooooooo
Cagão Boy!...
O colega, nunca mais falou comigo, só porque eu gostava da música, na verdade, do refrão. Mas todo mundo já estava cantando junto. Coitado, ficou debilitado, depois daquela correria toda. Mas depois, chegou-se a pensar que na verdade, ao invés de ele dar uma vasta cagada no mato, ele cagou para dentro, como disse uma parceira a quem perguntei se ela já havia feito sexo anal, se queria experimentar e depois que estreou, disse que “é, é, não é ruim, mas parece que a gente tá cagando pra dentro!” Pelo visto, aquela, foi a primeira incursão naquela viagem sem fim, pelo canais do reto que ele teve. Se gostou, ou não, nem me perguntem. Como a parceira sexual que depois de dizer que parecia que se estava cagando pra dentro, ainda me perguntou. “Não é?” Mas eu? Serei leso de brincar com meu anel? Depois queima a rosca, nem o Valastro dá jeito.
(...)
Só havia diferença entre veterano e calouro, na hora de ler os direitos dos calouros, mas em tom de brincadeira. Todos eram colegas, desde sempre. Só os calouros, revogados todos os termos anteriores, não tinham direito algum.
A descida do igarapé era feita de um ponto, distante, onde passávamos por praias de areia branca, até o final, no meio da floresta. Para chegar ao ponto de partida, era preciso caminhar por terra, quilômetros, subindo e descendo elevações, no meio da selva. Mas o que mais cansava, era ficar boiando naquele turbilhão de água. Se desse uma câimbra se ao menos uma cólica, o cara estava afogado em mágoas.
Parada para um almoço e volta para o igarapé.
Quando o sol começou a se por, não tinha como continuar essa aventura, reunião no salão de jogos, danças, cantorias, atividades de todo jeito. Outro grupo era responsável por isso. Inclusive os calouros que eram envolvidos desde o início.
A Acácia ficou lá para o alojamento feminino, acho que nem participou das festas, numa passagem sem iluminação que dividia o salão do alojamento delas. Quando fui buscar alguma coisa, ela me identificou no escuro.
- Theteco? Neste escuro, só dá para identificar duas pessoas, pelo vulto. O Carijó, por causa do tamanho e tu, porque estás andando de pernas abertas.
Aquela risada característica dela.
Mas no meio da brincadeira, a bolha estourou e finalmente pude curtir tudo, sem dor, nem atrapalhação. Era só furar com um alfinete, mas não tive tempo.
A maioria do pessoal foi dormir cedo. Ficaram só os parentes de anta, morcego e onça. Uns jogando sinuca, outros ping-pong, outros, cantando etc.. Acordados, só o pessoal no salão e os Dragões, botando fumaça por todos os poros. Acho que esses, nem dormiam.
Então, até o pessoal mais notívago, foi dormir. Ficaram poucos. A única coisa que se podia fazer era bater panela e melar todo mundo que dormitava, de pasta de dente. O que fizemos, mas durou pouco, então resolvi dormir encima da mesa de sinuca. Por pouco tempo, porque o pessoal foi embora, eu não iria ficar sozinho, na subida da floresta, nem a pau Dermeval. Eu estava muito bem confortável na mesa, mas de repente, só eu e vai que aparece uma anta, uma onça, esse negócio de ser comido, deixa para o Cagão Boy.
Então, já deviam ser umas 3:00h, fui procurar o beliche da Acácia. Haviam apagado as luzes dos alojamentos, estava difícil até de identificar qual era o quarto e qual o beliche em si. Encontrei, na base do apalpado mesmo. Peguei em bundas, peitos e outras coisas, sem ser a intenção.
- Acácia, afasta, vim dormir.
- Está lotado. Demoraste, tem gente.
Acho que era a Loura Poposuda da Biologia que depois fez Administração. Na passagem, a Kombi, no chão, do lado de fora, num saco de dormir enorme. Depois vim saber, era do Eronildo, Presidente do PCdoB, hoje conhecido como Eron. Saco de casal. Imagina! Que ótimo.
(...)
A Kombi era uma companheira com certa proximidade. Primeiro porque por diversas vezes, éramos os dois escalados para comprar os mantimentos na Feira do Coroado, para o almoço das sextas-feiras que era feito atrás do bloco de Agronomia e depois foi proibido. Fazíamos uma vaquinha, com o arrecadado, comprávamos os alimentos e as bebidas e depois, uma fogueira onde os peixes cozinhavam e nos fogões do Laboratório de Agronomia, o arroz, o acompanhamento. Muitas vezes acabava, por causa da briga entre a Acácia e o Menudo. Era Pepsi-Cola para todo mundo, a Acácia aproximava, o Menudo dizia que ia arrotar. Começava uma briga entre os dois, o Menudo arrotava, a Acácia jogava tudo fora e ia embora. Era uma tolice de parte a parte. Vou já deixar de comer, por causa de um arroto. Mas de certa maneira, é coisa tão sem educação, não sendo na cultura árabe.
Quando a Kombi e eu, íamos comprar as coisas, sempre pedíamos descontos nos pacus, nos limões, nos cheiros-verdes, nos tucunarés e levávamos bastante coisas. Era farta, as coisas frescas e baratas, mais do que comprar no Mercadão, ou em supermercados. Era direto na Feira do Coroado, para quem não sabe, depois que se passava do L’ Amour, ou antes de chegar aos motéis, para quem entra no Conjunto Petrus.
Outras vezes, íamos comprar refrigerantes, pois bebida alcoólica foi proibida.     
Depois é que a Acácia atentou para uma coisa que eu nunca havia prestado atenção.
- Tu já viste que quando tu brincas com o umbigo da Kombi, ela fica com os bicos dos seios, duros?
Era uma amiga querida, eu iria prestar atenção nessas coisas? Eu, moço de família?
Por fim, foi com quem tirei a virgindade das escolas de samba. Foi a primeira vez dela, apesar da Acácia dizer que aquele papo de que ela era virgem, era para boi dormir. Mas ela perdeu a virgindade, em desfilar em escolas de samba, também.
Desfilávamos pelos Assuanos na Folia, um bloco dos servidores da Universidade, mas acabou, porque queriam que migrasse para a categoria de escola de samba. Não havia estrutura para tanto, a Bateria que nos acompanhava, era da Aparecida, nem podia permanecer como bloco, pois todo ano vencíamos. As Presidentes da ASSUA, Arminda Mourão, companheira de Partido e a mãe do Manoel, ex-marido da Margá, uma senhora tão distinta, com um filho... Daqueles. Eu perguntava à ela, como podia, o outro filho, tão gente fina, ela, mas o Manoel. Depois a Margá me disse que ele era antipático igual ao pai. Não conheci essa figura do cancioneiro impopular.
(...)
Bem, de princípio, fazíamos acampamentos, a Margá, poucas pessoas e eu, mas o que era só uma barraca, o que umas senhoras que apareceram, perguntavam como cabia tanta gente e ficaram horrorizadas com a resposta de um engraçadinho.
- Cabem 4 pessoas.
- Mas tem tanta gente aí.
- Sim, mas um encima do outro, cabe muito mais gente!
As senhoras foram embora no mesmo instante, indignadas.
Depois de um tempo, ia tanta gente que acabou a festa.
Certa vez, convidaram um colega da Engenharia que pensou que fosse o Rambo. Foi armado com farda camuflada, faca de selva, coturno, parecia que iria à guerra. Levou inclusive rádio, o que nos acampamentos que fazíamos, era proibido. Enquanto ele ficava nas atividades Rambolescas, eu peguei intimidade com a noiva dele, coitadinha, estava com frio, de noite, todo mundo molhado do Virgem Outra Vez, o igarapé tão frio que nem com pinça, dava para achar o pincel, todos, só de sunga e tanga, quando nos reunimos para cantar e tocar o violão e conversar, eram as poucas atividades que se fazia à noite, nos acampamentos, antes de dormir. De repente acende um lampião que mais parecia farol de caminhão, logo atrás de mim. Ninguém levava nem lanterna, no máximo, uma fogueira que ficava longe, para cozinhar. A noivinha do Rambo estava no meio das minhas coxas, deitada, aconchegada, não deu nem para disfarçar.
- Querida, você está com sono? Quer ir pra barraca?... Vamos pegar gravetos para a fogueira?
Morta de sono. Na barraca, ela já estava acomodada. Fogo, eu já tinha o bastante, o cara é que atrapalhou.
Serei leso? Ele me convidou para ir ao meio do mato, não precisava, estava bom daquele jeito. A fogueira ardia até depois que íamos embora. Era preciso apaga-la com água.
No carnaval, de novo o casal apareceu no Assuanos. Só que o colega ficava distante da noiva. Sempre.
Eu estava comportadinho, esperando a hora de ir para a avenida, de ônibus, já havia estacionado o carro em frente à sede da ASSUA na Ferreira Pena, recostado, sozinho, entre uns carros, quando a noiva do colega chegou e queria me maquiar.
- Deixa eu te pintar!
Pintas como eu pinto?
- Obrigado!
Mamãe me ensinou a ser educado, o Alzheimer é que de vez em quando me faz esquecer essa educação.
Todo mundo de palhaço, maquiado até a alma. Ela pegou batón, o próprio estojo e começou a me pintar. Estava pintando o sete.
De repente aparece a irmã do coleguinha que fazia Biomédicas, acho que Farmácia. Era até “degustável”, mas era chata, antipática, dessas pessoas que não se juntam a ninguém. Ficava sozinha no banco do Bloco da Medicina, Farmácia e Odontologia.
- Vou falar pro mano o que vocês estão fazendo aí.
Iria dedurar que a cunhada estava com o pincel na mão, pintando a minha cara de palhaço, todo assanhado? Que fofoqueira. Maior dificuldade em removê-la de fazer uma tragédia daquelas.
- Fica calada...
Devo dizer que mantenho a amizade com o colega, mas o casamento deles, não durou muito tempo. Nem devia ter acontecido. Mas quem sou eu para me meter no meio da relação alheia.
(...)
Eu queria experimentar uma escola de samba que o desfile era no dia seguinte ao desfile dos blocos. Ninguém se prestou a me acompanhar. Margá estava exausta, acho que a Norminha não podia, ninguém se prestou a esta lida. Deixei no ar, mas no dia seguinte, como desfilamos de madrugada, resolvi dormir. Aliás, nem resolvi dormir. Eu deitei um pouco para descansar, quando vi, estava sonhando.
Muito parecido com um carnaval que passei no Rio, era folia à noite, praia de manhã bem cedo, cinema à tarde, um dia, depois do carnaval em Copacabana, onde a Norminha me encontrou, fui educado, falei para a Minerva tomar banho primeiro, fiquei de sunga, sentado na cama, acordei no outro dia, o pessoal chegando de mais um carnaval.
Mas em casa, molhado de suor, nem o ar-condicionado liguei, pois iria ficar alguns minutos. De repente fui acordado no susto.
- Uma amiga tua veio te ver.
Era preciso me acordar daquele jeito? Era a Kombi, em pé, quase encima de mim, na beira da cama.
- Vamos?
Ainda estava meio tonto, meio zonzo, meio dormitando.
- Vamos? Pra onde?
- Vamos ver a fantasia para sair na escola de samba.
Já era à tarde, quase tarde, hora de sair na avenida. Só deu tempo de comprar, remendar o que precisava, tomar um banho, ir buscá-la na casa dela, no Dom Pedro e ir para a avenida, que ainda era no Boulevard Álvaro Maia, parente da Loura Poposuda. Perdi o cabaço das escolas de samba, com a Kombi. No meio da confusão, ela ficou com um pessoal que bebia mais do que algodão em poça d’ água, uma família que levou inclusive lanche. Tudo muito família mesmo, mamãe, papai, titia, um grupo imenso que sempre saía. Enquanto ela estava bem entregue, fui prescrutar, ou perscrutar a escola de samba, ver o que se aproveitava, conheci uma moreninha, Deus me livre, ficamos caminhando, procurando um lugar para conversar, quando cheguei, a Kombi, a família, a ala estava toda organizada. Tomei o meu lugar, ao lado da Kombi, naquele tempo, as alas eram organizadíssimas, bem na frente e descemos o Boulevard, até entrar na Djalma. Foi minha primeira vez. Na avenida.
(...)
Mas então, na Campina, daquela vez, sozinho, sem mãe, nem lenço, nem documento, o único jeito era pedir para dormir com a Kombi. Espaço havia aos montes. Faltava só vontade política.
- Kombi, afasta, eu vou dormir contigo.
- Tudo bem, mas nem me toca!
Puxa, nós éramos super-amigos, que nem os Super Gêmeos da Liga da Justiça. Eu a considerava, quase uma irmã, bem, uma prima, digamos assim, uma amiga. Mas amigona mesmo. Nem se eu quisesse tocar alguma coisa, não tinha condições naquele momento. O dia inteiro descendo e subindo o igarapé, já deviam ser mais de 4:00h, eu estava realmente morto de sono, muito cansado, nem se ela, a Vera Fischer e a Rose di Primo juntas, ficassem nuazinhas na minha frente, eu estava muito, mas muito fora de combate. Realmente, dormimos juntos, nem sei onde ela estava, quando acordei para mais um dia de descida de igarapé.
Aliás, todos os pertences dos homens, ficavam no alojamento morro acima. Para pegar a escova de dentes, o sabonete, para enfrentar um novo dia, era preciso escalar montanha, entrar na selva, a maior aventura, mas de manhã, sol a pino, até eu era corajoso.  Acho que as bolhas haviam estourado, no dia anterior.
Na volta, o colega do Sul, acho que de Biomédicas, só faltou me bater no ônibus, porque eu cantava o Cagão Boy. Mas eu gostava.
Outro colega também lá de baixo do Brasil, que foi conosco, hoje não fala com a Acácia, nem a pau. Acho que foi uma leva da Unissinos que veio estudar em Manaus, depois que a Universidade do Rio dos Sinos, pegou fogo no Rio Grande do Sul. O pessoal vive queimando, tudo vira tragédia com fogo. Foi a Unissinos, a Boite Kiss, enquanto não pararem com a essa tolice de queimar, lá pelos Pampas, às pampas, muita coisa ainda vai acabar em cinzas. Podemos estar juntos, esse outro colega me cumprimenta, mas a Acácia, é invisível a ele.
- Esse cara ficou com raiva de mim, só porque a Kombi estava apaixonada por ele, estavam namorando e eu avisei que ele é viado.
Eu não avisaria. Como não avisei dos namorados baitolas que ela mesma teve. Cada um seja feliz como quiser.
Na volta, havia um jogo do Nacional, contra um time de fora. Então o ônibus deixou o pessoal na São Sebastião e nós decidimos ir ao estádio.
Passamos em frente à casa da Dona do Carmo, era aniversário de Piroka, tinha gente pacas, fui convidado, quando o sinal fechou, fiquei pensando se descia para ir à festa, todo sujo e melado da Campina, ou se ia ao jogo. Tomei a melhor decisão, para aquele contexto. Iria chegar enlameado ainda, cantando parabéns ao aniversariante, o pessoal iria me olhar de esguelha.
Duas vezes em que cheguei à porta da casa dele num aniversário e decidi não entrar. Nesta e noutra vez em que perguntei à minha namorada à época se ela queria ir ao aniversário, ou fazer outra coisa. Parei o carro à frente da casa, mas algo me dizia para não entrar.
Depois soube, quando fui a outro lugar, houve um entrevero entre Bustela e a então, Senhora Piroka. Teve até tapa na cara. Eu ficaria em uma situação vexatória, visto ser amigo de todos os envolvidos, não saberia nem como me comportar.
Mas nesse dia da Campina, também não fui à festa e cheguei na segunda-feira no Campus e falei que a festa tinha sido bastante concorrida.
- Não houve festa. O vovô morreu.
- Deixa de palhaçada, eu passei na frente, tinha gente pacas.
- O vovô morreu. Pergunta pro Bustela.
É meu amigo, mas tem um defeito de fabricação. É mitômano de nascença. Eu vou perguntar a um mentiroso de carteirinha se era mentira? Bustela escolheu bem a profissão. Advogado. Mente tanto que às vezes pergunta a própria idade aos outros. Eu iria perguntar a um mentiroso contumaz, se o Piroka estava mentindo? É como perguntar ao vendedor da loja que ganha comissão encima das vendas se um produto é bacana. Sempre é maravilhoso. Quanto mais Piroka falava para eu perguntar ao Bustela, mais eu acreditava que só podia ser uma grande mentira.
Depois de uma semana é que eu acreditei. O avô de Piroka havia morrido mesmo, no dia do aniversário dele. A noiva à época que virou “esposa bem cassada” e agora, ex-mulher, confirmou, então eu acreditei de verdade.
Piroka tem pavor de defunto, a namorada à época, fazia Laboratório de Anatomia, então, para chamá-la para irmos embora, ele passava longe, eu é que ia chamá-la e aproveitei para perguntar, longe dele, se o fato batia realmente.
É cada homem. Eu hein! Já estava tão acostumado com o Laboratório, o pessoal ia conversar e lanchar ali dentro, uma vez, sugeri à uma amiga, fazermos saliências lá, não tinha ninguém, lugar calmo, só um monte de morto e nós dois, hora do intervalo, o que atrapalhava era o formol.
Então o sinal abriu e fomos ao Estádio Vivaldão. Mochilas, sacos de dormir, barracas, todo mundo até com lama pelas pernas. Começou uma chuva, um toró que não dava para enxergar um palmo adiante. Nem sei quem venceu, mas ficamos todos molhados, ainda bem que a minha mochila, ou melhor, meu mochilão que eu usava em todas as viagens, era impermeável, baixou a temperatura, o jeito foi ficar pulando “pra não dar câimbra”. De repente as pessoas nas arquibancadas estavam pulando junto, gritando, só não se via o que aconteceu em campo.  Parecia que havia um cortina cinza, a dois palmos adiante. Lavou até a alma.

Mas isto foi num tempo, em que o Neoliberalismo estava em seu estuário, ainda de fraldas, o individualismo era visto como coisa feia e esse querer sempre mais e só para si, era coisa, principalmente, de menina mimada e mal fodida!  Hoje, trote nos colegas, é para revelar os recalques de gente que se sente, desde cedo, coisinha, gente miúda. Principalmente em São Paulo, onde essa questão de destratar o próximo de querer pisar no outro, é quase uma questão de fé.

Nenhum comentário:

OBSERVADORES DE PLANTÃO