Seu Korocka tentava dar o bote, a toda hora. Era solteiro, não devia satisfação a ninguém, pagava suas contas, enfim, era livre e desimpedido.
Tinha o maior orgulho de falar grosso e
ser macho. Sim, Século XXI, e ainda hoje, ser macho, é ser muitas vezes
desprezível, ser cafajeste tem mulher que incita essas tendências, como a coisa
a se manter intacta.
Tem gente que tem orgulho de ter nascido
louro, de ter olhos azuis, de ser nordestino, não cabe a mim analisar. São
questões que independem da pessoa, mas muita gente se vale disso, sem mais nada
a mostrar que seja seu de verdade, que tenha suado para conquistar, afora a
geografia e a genética e outros fatores que não lhes dizem respeito.
Só para mostrar quão macho era, fez uma
aposta com uns amigos que iria “pegar”, pelo menos umas três mulheres desses
antros onde se fala tanto em moral. E casadas.
Aposta casada, lá foi Seu Korocka, fazer a
investida.
Gente muito moralista, desconfie! Seu
Korocka sabia e fazia parte de grupos assim, mas tinha ódio de quem era do
mesmo jeito, mas de outra trupe. Como a música do Caetano sobre SanPa, de gente
que odeia quem não é espelho. Só vê imagem invertida.
Dona Ivete conta o caso de um senhor que
ia do trabalho para casa, de casa para o trabalho, insuspeito e homem de
família, era a imagem do cidadão descente, tanto que usava isso, para se impor
perante quem achava imoral, ou fora dos padrões cristãos. De repente se
descobriu que ele tinha uma amante, não era tudo aquilo que fazia questão de
mostrar. Justamente na passagem para casa, na mesma rua, para não perder tempo.
Era cheio de dar lição de moral em todo mundo. O típico senhor sem mácula.
Esses tipos que vivem de fazer tipo, tão carolas que são quase virginais, mesmo
que o passatempo preferido na juventude, fosse desvirginar meninas incautas e
se vangloriar de ser desprezível.
Entrou nessas igrejas, onde todo mundo
parece que está num reality-show,
onde vale mais a pose, do que a fé em si. Algo assim, como a Igreja de Nossa
Senhora de Nazaré nas manhãs de domingo? Será? Quem sabe! E a Dona Therezinha
veio me dizer que ficava com ódio, dessa mania de eu querer ser ateu, depois que
o padre que reza e ninguém entende nada porque parece que ele está ali, só para
cumprir tabela, para fazer média quanto tantos outros políticos e celebridades
que dão pinta por lá, perguntou quem era aquele moço ao lado dela, numa
recepção de bodas de casamento. “As filhas eu já conheço, mas esse rapaz estou
vendo por aqui, pela primeira vez!” E só porque era de um pessoal que eu tenho
estima e tinha doce no fim da xaropada, senão ele não me vai ver nunca mais. Eu
sempre conto que fui destacado para representar a turma da pós-graduação, na missa
para celebrar o aniversário do nosso colega que era o líder do Movimento
Carismático do Amazonas. Juro que tive medo de ser trucidado, por aquele povo
tão fanático. Parecia teatro bufão, onde as pessoas fazem mais caras e bocas,
do que o necessário. Os caras entrava na igreja, prostravam-se ao chão,
joelhavam com a mão no coração, o outro braço estendido aos Céus, se descobrem
que eu sou ateu – graças a Deus o colega que sabia nã revelou – iriam me jogar
na Fogueira das Vaidades, quero dizer, na Fogueira Santa, em plena Idade da
Computação. Computaria! A fé do consumo, ou o consumo da fé, não sei bem
explicar.
Pronto, Seu Korocka pegou a mulher do
pastor, a mais carola da cidade, a filha do tesoureiro, a atriz do templo que
fazia o papel da doente que recebia as graças e saía curada, a esposa do Seu
Arkibal. Quase o dobro da proposta inicial.
Ria com os amigos, por ter desmoralizado a
moral dos outros. Sua moral não era muito distante da dos outros, mas achava
que só seu grupo podia ser moralista. Era o macho!
Nova aposta, agora em outra cidade e em
outra agremiação de gente muito puritana.
Desde criança nos acostumamos a querer
sacanear os outros, ao invés de relevarmos o que nem nos está atingindo. Mas é
a mania do torcedor do time contrário querer aniquilar a torcida contrária, do
heterossexual querer acabar com os homossexuais, a sapatão ter ódio do
comportamento do viadinho, em suma, quando nos achamos por cima da carne seca,
sempre temos de liquidar quem é nossa imagem que não percebemos, por não estar
invertida.
Ele fazia questão de falar mais grosso,
nessas ocasiões. É como o pessoal que vem bebê para o Amazonas, mas quando
percebe que falando “dizoito”, “porrrrtão”, “Rôrãîma” essas coisas de descendente
de burros e jumentos que vieram para o Brasil e morreram sem aprender a falar o
nosso idioma mátrio e ainda passaram essa pobreza linguística para os
descendentes, quando percebem que assim se colocando, leva vantagem, pronto,
até exagera. Não perde o sotaque nem amarrado de corda. Até aprimora se
perceber que é melhor para ele em certos contextos.
Mas como sempre, para todo esperto, sempre
tem alguém mais esperto ainda. Dizem que quem mais cai naqueles golpes do
bilhete premiado, do prêmio por telefone que primeiro se tem de dar os dados
bancários, essas coisas de espertalhão, não são os tolos, muito pelo contrário,
mas quem se pensa muito esperto, quem acha que vai levar vantagem sempre. Aí
muito seguro de si, acaba dando uma de otário, em coisa que até os tolos
ficariam atentos.
A primeira “vítima” de Seu Korocka, nessa
nova intentona, era justamente Elena, uma loura de olhos azuis, mas que era a
imagem da desolação em vida. Nada mais fácil do que levar no bico, quem está
fragilizado.
Lá foi Seu Korocka, cheio de pose, cheio
de si. Os amigos que ficavam sempre por perto, para se divertirem, davam sinal
de positivo àquela nova conquista. Seu Korocka era o cara realmente. O homem
que trata a mulher como objeto, mas acha que é pós-contemporâneo, por ouvir
música assim, vestir-se assado, ao invés de aprimorar suas atitudes.
Ele ouvia no seu íntimo, os amigos
gritando em uníssono: “Vai Korockão! Mostra o que é ser macho! Coloca essas
mulheres aos teus pés! Mostra o que é bom pra tosse! Xarope Korocka muito másculo!
Vai Korockão!”
Essa era diferente. Enterneceu-o de certa
maneira que ele ficou com ela, além do tempo regulamentar. Ela não sabia dizer
o motivo de não durar muito com namorados e estava na idade de dar o quinto
tiro na macaca. Era vista pela multidão, nem mais como titia, mas como tia-avó.
Já passara do ponto, encruou e não amadureceu, como muitas frutas vendidas nos
supermercados de Manaus. Aliás, esse pessoal que se acha muito másculo,
cuidado, pois um erro ortográfico qualquer, passa a ser frase no idioma
espanhol, más culo e se traduzido,
não é muito macho não, muito pelo contrário, o macho acaba brincando com o anel
e não é de casamento, uma aliança sem futuro. É o que se diz, o cara é macho
pra picas, é homem pra caralho! Eu hein! Deixa eu ficar no meu canto, tocando
meu piano, cozinhando e lavando as minhas cuecas...
Seu Korocka ficou realmente consternado
com aquela história de vida, mas no ambiente machista que frequentava,
começaram a duvidar da masculinidade dele. Homem que pega mulher e cai na
lábia, começa a se preocupar com os problemas dela, ou casa, o que pelo menos
vai se estar com a pessoa como uma mercadoria adquirida com nota fiscal e quando
enjoa se torna distante apesar de morar no mesmo cômodo, ou larga de mão e vai
procurar outra, só para acrescer a anotação das conquistas, na ponta do lápis.
Seu Korocka realmente estava ligado na Elena
Pronto, estavam íntimos e ele decidiu
poupá-la do vexame de expô-la como troféu. Mas a carne é fraca, tal e coisa e
coisa e tal, acabaram “pow” se bem me
faço compreender. Estourando a boca do balão.
Pronto, a primeira estava no papo. Quando
Seu Korocka finalmente teve tempo para os amigos, chegou dizendo que se sentia
outro homem, aquela mulher o tinha feito notar que existem outras coisas nas
pessoas, além da buceta, dos peitos e do fiofó. Estava mais sensível, não sabia
explicar bem o que era. Os amigos começaram a olhá-lo com certo ar de
preocupação. De repente, a notícia correu a pequena cidade, que um forasteiro
tinha feito sexo com a Elena. Veio todo mundo para a praça e Seu Korocka com os
amigos não sabiam por que viraram atração de repente, todos riam da cara dele.
Tentou colocar aquele vozeirão para emular com aquele povo, mas seus próprios
amigos o demoveram dessa infeliz ideia.
- Korocka, não é por nada não, mas tu
estás falando fino.
- Eu falando fino? Olha bem pra minha
cara!
- É Korocka, vai por nós. Tu estás
realmente mudado, mas não é por dentro, é até na voz. Tu estás falando fino.
- Fodeu-se mano! Deixa de putaria!
- É sério!
Aí mesmo que aquela aglomeração riu a se
esbaldar. Então ele ficou sabendo que a Elena sempre perdia os namorados,
porque era conhecida como Torniquete de Coxas. Na excitação, ela dava uma chave
de coxas no parceiro que acabava como adversário no octógono, que até hoje, não
teve um que saísse incólume, principalmente nos testículos, onde muitos homens,
até hoje guardam toda sua masculinidade. Alguns raros casos, o atingido pela
tragédia, voltava a ter as gônadas sexuais de volta ao tamanho original, à
textura original etc. Mas a maioria ficou com o escroto – eis um nome correto
para aquele apêndice masculino – mais escroto do que o original, murcho e cheio
de rugas. Aquele negócio que é escroto, a começar pelo nome, virava enfeite sem
uso, para o resto da vida.
Seu Korocka então soube de um
proctologista que fazia milagres. Devo dizer que foi o mesmo que ficou
segurando minha glande, como se tivesse quase no clímax e disse que aquelas
veias que apareceram, só sumiriam operando. Ele podia fazer isso por mim. Até
hoje, acho que aquela delicadeza toda, não fazia realmente, parte do protocolo
médico, mas uma maneira de ter nas mãos, o objeto de desejo, sempre. Dias
depois, a cabeça da piroca estava normal e até hoje não descobri que grande
esforço deve ter sido aquele, segundo palavras daquele médico estranho. Mas convenhamos,
à época, eu tinha uns 20 anos, hoje estou na faixa dos 50, ele que devia ser
mais velho, hoje deve ser uma bicha da Terceira Idade.
Seu Korocka estava disposto a qualquer
coisa, para recuperar sua imagem de macho. Não podia ficar preocupado com a
realidade feminina, não podia chorar ao ver uma criança abandonada, não podia
ter compromisso com coisas que não lhe diziam respeito, não podia pensar que os
ouros também têm direitos, o mundo não fora feito só para si e essas atitudes
pouco viris, até atrapalhavam-no, em sua imagem. Afinal, vivemos a Era da
Imagem, da foto em 360º, do filme em 3D, aquilo no meio das pernas, estava
queimando o filme e se perdurasse maia ainda, podia até acabar queimando a
rosca.
Lá foi Seu Korocka em busca de salvação.
Dessa vez a bicha velha sentia prazer, em alisar seu saco. Para dissipar
dúvidas, disse que precisaria de muitas sessões de fisioterapia. E a
fisioterapia era justamente fazer ressuscitação boca-à-boca. E assim foi feito.
O Doutor se comprazia em cair de boca nos ovos dele e Seu Korocka realmente
queria fazer crer que acreditava naquela putaria. Mas sensível do jeito que
estava, até começou a sentir carinho pelo salvador da pátria. Acabaram fazendo mais carinho do que a sessão
de terapia recomendava.
Tudo bem, finalmente Seu Korocka voltou a
falar grosso, a tratar os outros, com grosseria, com desprezo, quando não tinha vontade de
satisfazer seus desejos com elas, afinal era macho de novo. Comprou até cueca
nova, pois a fisioterapia, havia aumentado até o tamanho do obejeto abjeto de
desejo dos travestis. Nem precisou comprar aquele aspirador de sucção de pênis
que oferecem nesses programas de televendas.
Ele, como muito machão que acha que é mais
macho do que os outros, por “comer” viado, para não sobrar suspeitas sobre sua
sexualidade, convidou o proctologista para um jantar à luz de velas e apagou-o,
ali mesmo, enquanto as velas cobrejavam a iluminação. Afinal, macho que é
macho, tem pavor de escândalo e de enfrentar a opinião alheia.
Seu Korocka, macho quanto tantos outros
que se perderem o tesão, deixam de ser homens e acabam brochando a vontade de
viver, finalmente estava de volta. Falando grosso!
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